Três variedades cítricas resultantes de trabalho de pesquisa e desenvolvimento em parceria entre a Embrapa, a Fundação Coopercitrus Credicitrus (FCC) e o Centro de Citricultura Sylvio Moreira (CCSM), vinculado ao Instituto Agronômico (IAC), estão disponíveis para o pequeno agricultor brasileiro.
Em comum acordo entre as três instituições, a laranjeira-doce precoce BRS IAC FCC Alvorada, a laranjeira-de-umbigo Navelina XR e o limoeiro BRS EECB IAC Ponta Firme passaram pelo Registro Nacional de Cultivares, do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), mas não estão protegidas. “São acessos antigos que carregam o esforço de muitas instituições e nós entendemos que o lançamento deveria ser em conjunto. Além disso, são materiais que já estão sendo cultivados pelos produtores em pequena escala, o que demostra que já são de domínio público”, explica Eduardo Augusto Girardi, pesquisador da Embrapa Mandioca e Fruticultura (BA) e coordenador da Unidade Mista de Pesquisa e Transferência de Tecnologia (UMIPTT) Cinturão Citrícola, sediada no Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus) em Araraquara (SP).
Laranjas
A BRS IAC FCC Alvorada é uma cultivar de laranjeira-doce precoce, com frutos sem sementes e de alta qualidade para processamento de suco e mercado in natura. Apresenta precocidade na entrada de produção e boa produtividade. A maturação é mais precoce que a da Hamlin, cultivar de referência nesses usos. Apresenta nota mais alta na prova de degustação de suco pasteurizado e notas de avaliação de cor e de sabor do suco superiores.
Tem de zero a três sementes, podendo ir para o mercado de fruta fresca. “Hoje existe a necessidade de laranjas precoces e a Alvorada atende a um nicho, diante de suas qualidades”, explica o pesquisador Eduardo Girardi.
A produção da variedade se destaca em áreas cujas condições de clima sejam similares às de Bebedouro, na região Norte do estado de São Paulo, que apresenta clima subtropical, com inverno moderado e seco, com uso de irrigação. Esse tipo de clima engloba também parte da região Central do Estado. Seu melhor desempenho se dá nas condições do Sudoeste e extremo Sul de São Paulo, devido à sua excelente qualidade de frutos e à baixa incidência de seca fisiológica de ramos. A variedade pode ser enxertada em citrumelo ‘Swingle’, tangerineira ‘Sunki’, tangerineira ‘Cleópatra’ e limoeiro ‘Cravo’.
Indicada para consumo in natura, a Navelina XR é a única laranjeira conhecida como naturalmente resistente à bactéria causadora da clorose variegada dos citros (CVC), sem sofrer danos nem sendo hospedeira ou fonte de inóculo. Popularmente conhecida como amarelinho, a CVC é uma importante praga que acomete a citricultura brasileira desde os anos 1980, podendo ser disseminada por inseto vetor (mais de onze tipos de cigarrinhas) e também por mudas infectadas. “Ela é uma excelente alternativa para cultivo na presença dessa doença, já que dispensa podas ou controle dos vetores. Além disso, o mercado brasileiro tem carência de oferta de variedades de laranjas de mesa, particularmente de umbigo, e com frutos de boa qualidade”, afirma Eduardo Girardi.
A variedade apresenta frutos típicos de laranja Baianinha: sem sementes, com maturação precoce a meia-estação e que se conservam nas plantas após atingirem a maturidade comercial, mas com certo grau de granulação. A produtividade média é de 15 kg/planta aos 4 anos de idade e 100 kg/planta aos 10 anos. É indicada para o estado de São Paulo, preferencialmente em regiões com temperatura mais amena.
Helvecio Della Coletta Filho, pesquisador do CCSM, participou dos testes de respostas da Navelina XR à infecção por Xylella fastidosa, realizados no Laboratório de Fitopatologia da instituição. “Pesquisas foram realizadas infectando esta variedade de laranja-doce com a bactéria X. fastidiosa e acompanhando a infecção através de técnicas moleculares e isolamento da bactéria em meio de cultura”, relata.
Para Coletta Filho, a grande vantagem da Navelina XR é, realmente, a resistência à bactéria X. fastidiosa e à CVC. “Mesmo com infecção, não foi observada diminuição no tamanho dos frutos ou sintomas foliares severos. Alguns sintomas foliares foram observados, mas com posterior regressão. Em condições de alta severidade de CVC, a variedade poderia ser uma opção de cultivo para quem quer produzir laranja de mesa. Por ser uma variedade de umbigo, não é recomendada para processamento industrial”, salienta.
Limão espetacular
A limeira-ácida Tahiti BRS EECB IAC Ponta Firme tem elevada produtividade de frutos (80 toneladas/hectare, 242% superior à média do estado de São Paulo) de alta qualidade e maior produção na entressafra. Apresenta precocidade de entrada de produção (a partir do segundo ano) com alta eficiência de produção de frutos por copa. É indicada, como fruta fresca, para os mercados doméstico e de exportação, para processamento de suco e extração de óleo essencial.
Inicialmente, a variedade é indicada para as regiões Centro, Norte e Noroeste do estado de São Paulo, preferencialmente em áreas irrigadas. Além do citrumelo Swingle, os outros porta-enxertos indicados são os trifoliatas Flying Dragon e comum, a tangerineira Sunki BRS Tropical, os limoeiros Cravo e Volkameriano e os citrandarins Indio e San Diego. Precoce na entrada de produção, a variedade produz, de forma natural, sem nenhum tratamento, mais frutos no segundo semestre.
Aprovação de produtores parceiros
O produtor Edvaldo da Costa Mello, de Paranapuã (SP), é um entusiasta do BRS EECB IAC Ponta Firme, que cultiva há aproximadamente 10 anos, desde quando recebeu as mudas do pesquisador Eduardo Stuchi para acompanhar e validar na Fazenda Santa Rita. Com o pomar 100% irrigado, tem hoje, 14 mil plantas enxertadas em Fly Dragon. “Rústica, vigorosa, produtiva, com qualidade de fruto e uniformidade do pomar”, assim Mello define a variedade. “Hoje o Ponta Firme é a base do limão Tahiti no estado de São Paulo. Ele deu estabilidade nas plantações”, explica.
Já o engenheiro agrônomo Helton Carlos de Leão, sócio-consultor da Smart Citrus, participou dos trabalhos de avaliação da variedade BRS IAC FCC Alvorada, em experimento montado na região Sul do estado de São Paulo, na empresa em que trabalhava anteriormente, a partir do momento que as plantas começaram a produzir.
“Realizamos uma pesquisa onde unimos os pesquisadores da Embrapa, a indústria e a empresa que comercializa suco no exterior. Quando maduras as frutas, retirávamos amostras de frutos e processávamos, fazendo suco NFC, o qual enviamos amostras para degustação e avaliação por um painel de especialistas da empresa. Daí, vimos que a variedade produzia um suco de coloração intensa e com características organolépticas diferenciadas. Foram vários anos de avaliação e os resultados são muito consistentes”, recorda Leão.
Por conta da performance, Leão resolveu investir, pessoalmente, no cultivo da BRS IAC FCC Alvorada. “A variedade tem um potencial tão grande que, recentemente, implantei um pomar próprio e ela foi a primeira variedade que plantei na minha área. Pode acreditar. O material é muito bom”, ratifica.
O engenheiro agrônomo José Eduardo Teófilo, fundador e integrante do Grupo de Consultores em Citros (GConci), viveirista e produtor de citros em Altinópolis, Mococa e São José do Rio Pardo (SP), acompanha de perto a performance das variedades BRS IAC FCC Alvorada e BRS EECB IAC Ponta Firme. “Plantamos numa fazenda, uns 12 anos atrás, um experimento com diversas variedades que Eduardo Stuchi (pesquisador da Embrapa falecido em 2024) enviou. Dentre elas, estava a Alvorada, que é uma fruta muito interessante para o nosso Estado, porque tem uma qualidade de suco numa época precoce, que vai de maio até julho, e tem de zero a três sementes, ou seja, quase nenhuma semente. O suco tem boa cor, que é muito importante para se fazer o NFC, o suco pronto para beber que fica refrigerado, e está sendo produzido por várias pequenas fábricas. Aparentemente, ela é bem produtiva. Temos que acompanhar, ao longo da vida dela, se ela se mantém constante”, salienta.
“Quanto ao BRS EECB IAC Ponta Firme, além da produtividade, ele mantém a uniformidade de planta, não tem oscilação de uma planta para outra, o formato do fruto é bonito, carrega bem e é bem produtivo. Ele basicamente está consolidado. Conheço produtores das duas variedades e eles estão gostando”, afirma.
Léa Cunha
Embrapa Mandioca e Fruticultura