Pesquisa desenvolve bebida e queijo análogo feitos de coco babaçu

A amêndoa do coco babaçu é a principal matéria-prima de um análogo de queijo e de uma bebida desenvolvida pela Embrapa. Os produtos vegetais podem substituir os lácteos, tanto para quem não pode consumir laticínios tradicionais ou simplesmente não quer consumi-los. Além disso, os produtos são novas opções de renda para as organizações comunitárias de mulheres quebradeiras de coco babaçu do Maranhão, que já produzem sorvetes, biscoitos, entre outros itens.

Segundo a pesquisadora da Embrapa Cocais  e líder do projeto,  Guilhermina Cayres, os alimentos produzidos a partir da biodiversidade brasileira, que valorizam o conhecimento tradicional e a história de grupos sociais, têm grande potencial para atingir um nicho de mercado que aprecia produtos com tais características. É o caso dos alimentos à base de babaçu feito por mulheres quebradeiras de coco. “Quando o saber local é associado à ciência, o valor agregado aumenta. Tanto a bebida vegetal, que é semelhante ao leite, quanto o análogo de queijo representam oportunidades de inovação na cadeia de valor do babaçu, unindo conhecimento tradicional e científico, gerando negócios e promovendo o empreendedorismo de organizações comunitárias em torno de uma espécie da sociobiodiversidade: o babaçu”, afirma.

Selene Benevides, pesquisadora da Embrapa Agroindústria Tropical, no Ceará, que desenvolveu o análogo de queijo, o projeto tem impacto nas  comunidades de quebradeiras de coco, cuja sobrevivência depende do extrativismo vegetal. “No Maranhão, eles já produzem alguns alimentos à base de babaçu. Esses novos produtos tiveram seus parâmetros avaliados com base em similares de acordo com a legislação e o mercado”, explica. O análogo de queijo é o primeiro queijo vegetal de babaçu desenvolvido pela Embrapa. “Esperamos que esse produto aumente o portfólio de produtos de babaçu e alcance nichos de mercado, gerando renda e qualidade de vida às quebradeiras”, comenta.

O sabor e aroma do análogo de queijo são semelhantes aos dos produtos lácteos fermentados. Benevides explica que, devido ao sabor adocicado do babaçu, a fabricação envolve um processo de fermentação que reduz a doçura, aumenta a acidez e confere sabor e aroma semelhantes aos queijos tradicionais. Uma fonte de proteína de soja foi adicionada, e o resultado foi um tipo de queijo apresentando todo o teor de proteína de um tradicional.

Queijo análogo de Babaçú. Foto: Divulgação Embrapa

A bebida vegetal é um extrato obtido da amêndoa moída da amêndoa de babaçu em água, na proporção de 1 kg de amêndoa para três litros de água, além de outros ingredientes para melhorar sua estabilidade e sabor. O produto deve ser pasteurizado para ficar pronto para consumo e mantido em temperatura de resfriamento, podendo ser consumido em até 15 dias, como outras bebidas pasteurizadas de origem vegetal.

O mercado nacional já apresenta diversas bebidas industrializadas de origem vegetal, feitas de castanha, arroz, entre outros, mas não há nenhuma feita de coco babaçu. O pesquisador  Nedio Wurlitzer , também da Embrapa Agroindústria Tropical, que trabalhou no desenvolvimento do produto, diz que a principal proposta é apresentar novas possibilidades de uso do coco babaçu, o que permite atingir novos nichos de mercado no Maranhão, valorizando o preparo artesanal. Segundo Wurlitzer, as pesquisas foram baseadas no conhecimento adquirido com produtos similares e extratos hidrossolúveis, que têm aparência leitosa, como bebidas feitas de castanha de caju, amêndoa e arroz, levando em consideração também o conhecimento das quebradeiras, que extraem a bebida da amêndoa.

Ambos os produtos apresentaram bom desempenho em análises sensoriais e testes de intenção de compra. A aceitação do análogo de queijo foi 7, em uma escala que varia de 1 a 9, e a intenção de compra foi 4, em uma escala que varia de 1 a 5. A bebida apresentou aceitação de 6,4, em uma escala que varia de 1 a 9, e intenção de compra de 3,5, em uma escala que varia de 1 a 5. O rendimento da bebida também é importante mencionar: cada quilograma de amêndoa de babaçu produz três litros da bebida, o que é uma quantidade excelente para a indústria.

Capacitação incentiva quebradeiras de coco  

Para multiplicar os conhecimentos gerados no processo de inovação social, as quebradeiras receberam treinamentos e passaram a treinar outras comunidades sobre produção e boas práticas dos novos alimentos do babaçu para promover o empreendedorismo e a autonomia das mulheres. Os novos produtos incentivaram as quebradeiras de coco, que já trabalham com o uso de outros alimentos derivados do babaçu em cooperativas de fabricação. 

A quebradeira Gracilene Cardoso considerou importante aprender a trabalhar com o babaçu de outras formas. “Com a capacitação, ganhamos mais um derivado de qualidade, que vai aumentar nossa renda”. Ela afirma que tem orgulho de trabalhar com coco babaçu, atividade que exerce desde criança, e é o mesmo trabalho que sua mãe e avó faziam. “Tenho orgulho de ser uma quebradeira de coco babaçu, porque é um produto natural. Não precisamos derrubar árvores, queimar ou usar agrotóxicos para plantar babaçu, o que usamos é fornecido pela natureza”, diz.

A quebradeira Rosana Sampaio diz que com os novos itens poderá melhorar o portfólio da cooperativa em que atua. “Vamos contar com um produto de alta qualidade, que vai proporcionar melhor renda”, comemora. Ela destaca que as quebradeiras ganham muito pouco e conhecer o processo é importante para valorizar a atividade”. 

A quebradeira Antônia Vieira, da comunidade quilombola do Vale do Itapecuru-Mirim, acredita que, com os novos conhecimentos, o processo produtivo vai melhorar. Ela é gestora da agroindústria da comunidade quilombola Pedrinhas Clube de Mães e é uma das empreendedoras do negócio coletivo Delícias do Babaçu. “Temos ideias novas aqui, e elas são ótimas”, comenta. 

Maria Domingas Marques Pinto, fundadora da Cooperativa das Quebradeiras de Coco de Itapecuru-Mirim, da comunidade Pedrinhas Clube de Mães, resume a importância do trabalho integrado: “Um sonho sonhado sozinho é só um sonho que se sonha sozinho, mas um sonho sonhado junto vem verdadeiro”.

A força que vem das florestas de babaçu no Maranhão 

O babaçu, produto da sociobiodiversidade brasileira, garante a base da economia extrativista de milhares de famílias de comunidades tradicionais localizadas principalmente nos estados do Maranhão, Tocantins, Pará e Piauí. Segundo o pesquisador Roberto Porro, do Núcleo Temático de Agricultura Familiar e Dinâmica Ambiental da Embrapa Amazônia Oriental, no mercado tradicional de produtos de babaçu, o fruto é o principal componente da palmeira, devido à sua parte mais nobre: ​​a amêndoa.

O estado do Maranhão concentra mais de 90% do total de amêndoas de babaçu produzidas e comercializadas no Brasil. Além disso, as comunidades, nas quais o extrativismo do babaçu é praticado tradicionalmente, são caracterizadas pela proeminência e protagonismo das quebradeiras de coco babaçu, cuja identidade sociocultural está ligada à extração das amêndoas para subsistência e venda aos comerciantes locais destinadas à indústria do petróleo.

A procura do mercado por produtos artesanais da biodiversidade, com indicação de origem, identidade sociocultural, impacto socioambiental positivo e que atendam consumidores veganos e com restrições alimentares abre caminhos para a construção de uma nova história para o babaçu, estratégico como âncora de um sistema agroalimentar característico do Maranhão, referência da bioeconomia pelo uso sustentável dos recursos naturais da biodiversidade com a floresta em pé.

Castanha de Babaçu. Foto: Divulgação Embrapa

Parceiros nacionais e internacionais 

O projeto é a extensão de experiências recentes da Embrapa Cocais com inovação aberta, envolvendo parceiros institucionais e quebradeiras de coco do território do Vale do Itapecuru e da microrregião de Chapadinha, no Maranhão. Parceiras deste projeto, as organizações comunitárias têm tradição no extrativismo e no processamento de alimentos à base de babaçu. Além disso, faz parte de outros estudos avançados sobre alimentos à base de babaçu, como novas formulações de biscoitos, sorvetes e outros alimentos, desenvolvidos por quebradeiras de coco e parceiros.

As organizações comunitárias envolvidas na pesquisa são as seguintes: Cooperativa das Quebradeiras de Coco Babaçu de Itapecuru-Mirim ( Coobavida), União dos Clubes de Mães de Itapecuru-Mirim, Associação das Quebradeiras de Coco Babaçu do Povoado União do município de Itapecuru-Mirim, Clube de Mães Quilombolas Lar de Maria , Agroindústria Comunitária de Derivados do Babaçu, Associação das Quebradeiras de Coco de Chapadinha , Cooperativa Mista da Agricultura Familiar e do Extrativismo do Babaçu do Vale do Itapecuru (Coomavi), entre outros. Direta e indiretamente, existem parceiros institucionais público-privados, como a Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Instituto Federal do Maranhão (IFMA), Universidade Federal do Ceará ( UFC ), Associação Maranhense dos Artesãos Culinários (Amac) e  Conecta Brasil 360, este último para dar visibilidade, conexão e estrutura de negócios para os produtos à base de babaçu. O projeto está contribuindo para construir um processo de inovação social com grupos de quebradeiras de coco babaçu. 

Produção dos alimentos. Fotos: Beatriz Monteiro

Pesquisas realizadas no âmbito do  Projeto Bem Diverso  

Uma parceria entre Embrapa, Fundo Global para o Meio Ambiente (GE) e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) –, além de financiamentos da Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (Fapema), The Good Food Institute (GFI), Agência Alemã de Cooperação Internacional (GIZ) e Rede Integrada Lavoura-Pecuária-Floresta (Rede ILPF).

Verônica Freire 
Embrapa Agroindústria Tropical

Flávia Bessa 

Embrapa Cocais