Nova plataforma digital reúne tecnologias e serviços para criadores de abelhas

Objetivo da Infobee é ajudar apicultores e meliponicultores na gestão da atividade e superação de gargalos tecnológicos 

A Embrapa apresenta a plataforma Infobee, um espaço virtual que disponibiliza serviços inéditos aos criadores de abelhas de todo o Brasil. A iniciativa, que é fruto da parceria público-privada entre a Embrapa Amazônia Oriental (PA) e a empresa Equilibrium Web, reúne informações técnico-científicas, econômicas e de mercado sobre a apicultura e a meliponicultura. O novo espaço digital pode ser acessado por computador e equipamentos móveis, como smartfones e tablets.

A Infobee traz os resultados da pesquisa agropecuária nas áreas de apicultura e meliponicultura (atividade de criação de abelhas nativas sem ferrão, do gênero Melipona), na forma de publicações, cursos, vídeos, animações e aplicações web. “O propósito da solução é auxiliar o processo de tomada de decisão dos criadores de abelhas a partir do acesso a informações relevantes que possam promover a melhoria na gestão ou a superação de gargalos tecnológicos na atividade”, afirma o analista de sistemas Michell Costa, da Embrapa Amazônia Oriental.

Entre os destaques da nova plataforma estão: o Calendário Apícola Digital, que disponibiliza informações sobre o local de ocorrência e a época de floração das plantas mais visitadas pelas abelhas na região amazônica; o meliponário virtual, uma maquete em três dimensões da estrutura do ninho, das caixas de criação e da morfologia da abelha; e o serviço denominado “zapbee”, respostas com o uso de Inteligência Artificial para atender aos criadores a qualquer hora e lugar.

A ferramenta também disponibiliza painéis interativos sobre produção e exportação de mel e derivados no Brasil. “Essa funcionalidade permite conhecer a produção de mel por mesorregião do Brasil nos últimos dez anos, bem como acessar dados sobre a exportação do produto por ano nos estados brasileiros”, conta Costa. Os painéis são atualizados permanentemente a partir do monitoramento anual da produção de mel, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Para Sebastião Júnior, que é proprietário e CEO da Equilibrium Web, responsável pelo codesenvolvimento do espaço digital, o desafio de criar uma plataforma para um segmento específico de mercado foi o propósito da empresa. “Quando trabalhamos com desenvolvimento de sistemas, nosso foco é sempre chegar a uma ferramenta útil para a comunidade e que cumpra o seu objetivo”, afirma.

O mercado de mel e derivados no Brasil é um setor em crescimento, tanto na produção quanto na exportação. Segundo a Pesquisa Pecuária Municipal do IBGE, o país alcançou em 2022 um recorde de produção, com quase 70 mil toneladas, obtendo aumento de 9% em relação a 2021.

A plataforma é dinâmica e aberta a incorporar novas funcionalidades e informações, de acordo com o empresário. “A ferramenta foi desenvolvida a partir de um gerenciador de conteúdo intuitivo, maleável e de fácil utilização. Com isso, novos conteúdos podem ser criados e disponibilizados a partir da indicação e sugestão dos próprios usuários. Isso significa que a Infobee vai crescendo de acordo com as necessidades da comunidade”, ressalta.

O trabalho de escuta dos usuários é permanente, segundo os desenvolvedores. “O próprio desenvolvimento da plataforma é fruto de um trabalho de escuta realizado junto aos atores da cadeia produtiva do mel no estado do Pará, em 2019, que motivou o desenvolvimento de um projeto em parceria com a iniciativa privada”, lembra o agrônomo Daniel Santiago, pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental.

Inteligência Artificial na palma da mão

Uma das inovações da plataforma Infobee é o serviço chamado “zapbee”, que responde às dúvidas de criadores de abelhas e interessados no tema a qualquer hora e em qualquer lugar. O serviço está disponível na modalidade web e usa a tecnologia de Inteligência Artificial (IA) para interagir com os usuários.

“Não estamos criando uma tecnologia nova, estamos usando uma nova tecnologia para criar um serviço e a inteligência escolhida foi o ChatGPT”, explica Sebastião Júnior.

Para a apicultora Francidalva Monteiro, do município de Primavera, a possibilidade de ter um canal com informações confiáveis para o esclarecimento de dúvidas no celular é fantástico. “Na hora que eu tiver uma dúvida, eu acesso o aplicativo e resolvo. Vou dar um exemplo: eu perdi um enxame, se tivesse a informação naquela hora do manejo, eu não perderia”, destaca.

O processo de ensinar a IA sobre a criação de abelhas envolveu a conversão em dados de resultados da pesquisa agropecuária sobre o tema já publicados em texto, áudio e vídeo. A ferramenta transforma esses dados inseridos em conhecimento para que possa responder às perguntas dos usuários. “A primeira etapa do ‘zapbee’ já foi feita e está disponível na versão web. A segunda etapa será levar o serviço ao aplicativo de mensagem nos dispositivos móveis”, completa o CEO da Equilibrium Web. 

Ciência e conhecimento popular

O Calendário Apícola Digital é um dos serviços desenvolvidos a partir da demanda dos criadores de abelhas no estado do Pará. O serviço traz a identificação correta das plantas mais relevantes para as abelhas, sejam elas do gênero Apis ou Melipona, a região de ocorrência e a época de floração, inicialmente para a região Nordeste Paraense. “O calendário é uma demanda antiga dos criadores. Com esse produto, eles conseguem visualizar claramente o período de floração de cada planta, a importância dessas plantas para a apicultura e a meliponicultura e conseguem planejar o manejo das colônias para a produção de mel”, afirma Kamila Leão, agrônoma e gerente de Assistência Técnica e Gerencial (ATeG Mel) – do Serviço de Aprendizagem Rural (Senar).

O calendário foi construído em oficinas realizadas pela Embrapa e pelo Senar em 11 municípios paraenses, nas regiões do Baixo Amazonas, Nordeste e Sudeste Paraense, pesquisadores, técnicos e criadores de abelhas trocaram informações e conhecimentos sobre a flora local e a importância dela na alimentação das abelhas.

O primeiro passo na construção desse produto, como explica a agrônoma, foi o levantamento, na literatura, das plantas mais importantes para as abelhas no estado do Pará, que levou à identificação de cerca de 400 plantas. “O passo seguinte foi ir a campo e conhecer a experiência dos criadores. Os próprios produtores indicaram as plantas mais importantes em cada município para a sua produção de mel”, conta a especialista.

As plantas citadas pelas comunidades foram identificadas no herbário da Embrapa Amazônia Oriental, validadas junto ao levantamento científico e incluídas no calendário. “Isso gerou um produto no qual é possível acessar o nome popular, de acordo com a localidade, o nome científico e o período de floração de cada planta na região. Inicialmente, foram construídos calendários para cinco associações de produtores no Nordeste do Pará. Mas a nossa intenção é gerar um calendário mais robusto para todo o Estado”, finaliza Leão.

Diversidade de plantas

A apicultora e meliponicultora Joelma Nunes, do município de Primavera, localizado na região Nordeste do Pará, afirma que a região possui um vasto pasto apícola, muitas vezes desconhecido pelos produtores e que pode ser melhor aproveitado. O pasto ou flora apícola é o conjunto de plantas interessantes para as abelhas na coleta de recursos, principalmente pólen e néctar.

“Sabemos que temos um pasto apícola muito rico, mas não temos conhecimento de como explorar isso. Com o calendário e a época das floradas do mês, conseguimos nos organizar para colocar a captura dos enxames. Além de identificar o melhor local para colocar o nosso apiário”, destaca a criadora.

“Nem nós mesmos sabíamos que conhecíamos tantas plantas apícolas e o potencial que têm na nossa região. É um vasto conhecimento popular”, afirma Andréa Sena, meliponicultora da zona rural do município de São João de Pirabas, no Nordeste Paraense.

Ela, que trabalha com o mel das abelhas-sem-ferrão e a produção de bebidas e licores, disse que só descobriu o tamanho do conhecimento que tinha a partir do trabalho realizado com técnicos e outros produtores. “Conseguimos enxergar a diversidade da nossa região e o nosso conhecimento em um material palpável para nos apoiar. O calendário contribui diretamente para o nosso dia a dia, permitindo conhecer os períodos de florada e quando precisamos alimentar as abelhas”, destaca.

Ferramenta em 3D reproduz meliponário físico

O meliponário virtual é uma ferramenta de apoio à criação das abelhas sociais nativas, as abelhas sem ferrão. Com informações em texto, áudio e imagens em três dimensões, ele traz todos os elementos presentes em um meliponário físico: as caixas de criação, as estruturas do ninho e a morfologia da abelha. A ferramenta mostra ainda a importância e o trabalho da abelha canudo (Scaptotrigona postica) na polinização do açaizeiro.

Acesse em:https://www.infobeebr.com.br/servicos/meliponario/

Inclusão social e conservação ambiental

A meliponicultura é uma atividade exercida em diferentes regiões do Brasil. O país tem 244 espécies de abelhas sociais nativas conhecidas pela ciência. Dessas, 215 estão na Amazônia Legal.

 A criação dessas abelhas, segundo o pesquisador Daniel Santiago, é desenvolvida em complemento à renda e conciliada com outras atividades agrícolas, especialmente na agricultura familiar. “É uma atividade inclusiva, geradora de renda e que contribui muito para a conservação ambiental”, pontua.

Santiago ainda cita que geralmente a apicultura, a atividade de criação das abelhas exóticas africanizadas (Apis mellifera L.), tem sido a atividade de geração de renda mais rápida, em volume de mel e renda. “A partir dessa experiência o produtor passa a conhecer mais sobre as abelhas, e muitas vezes se torna meliponicultor, porém, o contrário também pode ocorrer”, acrescenta. 

Joaquim de Aviz Silva e a esposa Leuciléa Dias Silva foram morar no interior do Pará, em Quatipuru, região Nordeste do Estado, depois que se aposentaram, e desde 2007 começaram a criar abelhas. O casal iniciou na apicultura e, mais recentemente, começou a manejar as abelhas sem ferrão. “Tudo começou como um hobby, mas a atividade se transformou em renda e quanto mais aprendemos, mais conhecemos e gostamos das abelhas”, comemora Aviz. 

Ele e a esposa são produtores de mel e estão se dedicando principalmente às abelhas sem ferrão. “É uma atividade terapêutica, qualquer pessoa pode criar as abelhas e faz bem para a mente”, conta Lea. “As abelhas só fazem bem, melhoram a agricultura, o meio ambiente e ainda deixam o mel. É um complemento muito importante da renda do agricultor familiar”, garante Aviz.

“Nos últimos anos, a atividade vem crescendo nos estados do Amazonas, Rondônia e Pará, em função da existência de abelhas nativas especialistas na polinização do guaraná, do cafeeiro, e do açaizeiro”, complementa Santiago.

As espécies de abelhas sem ferrão (meliponicultura) são de ocorrência ecorregional, mesmo considerando um bioma único, como no amazônico. Por exemplo, no Pará, a jupará (Melipona interrupta) é encontrada com dominância no Oeste do Estado; a uruçú boca-de-renda (M. seminigra), na região Sudeste Paraense; e as uruçus amarela (M. flavolineata) e cinzenta (M. fasciculata), na região Nordeste do Estado.

Desafios da atividade

“Apesar do enorme potencial, a atividade ainda é limitada devido a diversos fatores, como volume, homogeneidade e qualidade da produção, além da falta de organização do segmento produtivo”, analisa o pesquisador.

Já a apicultura, afirma Santiago, consegue potencializar a organização dos produtores em associações, seja pelo uso dos equipamentos, pela mão de obra compartilhada e pelo volume de produção, que é maior em relação à produção da meliponicultura.

“Considerando que as atividades de criação racional de abelhas sociais são tipicamente exercidas por agricultores familiares, cada uma delas possui especificidades próprias, seja relacionado aos seus produtos e/ou ao comportamento das espécies de abelhas com relação ao ambiente”, analisa o pesquisador.

A presidente da Cooperativa de Trabalho dos Agricultores Familiares de Primavera (Cooprima), Joelma Nunes, afirma que um dos maiores entraves à meliponicultura na região é a dificuldade em torno da legislação. “Para vender a produção, os meliponários precisam estar registrados juntos aos órgãos responsáveis e a produção deve atender às boas práticas. Esse tipo de informação precisa chegar na ponta para transformar a realidade”, explica.

Nos últimos anos, os estados do Amazonas e Pará implementaram legislações para potencializar a criação das abelhas nativas (Resolução CEMAAM Nº 34 de 27/12/2021) e a comercialização de produtos (Portaria N°7554/2021). “Essas legislações vêm fomentando a organização da cadeia produtiva em seus estados, porém a atividade ainda carece de subsídios”, avalia Santiago. Ele vê o pagamento por serviços ecossistêmicos como uma ferramenta importante para subsidiar os produtores e fortalecer a atividade na Amazônia. 

Ana Laura Lima

Embrapa Amazônia Oriental