País se tornou maior exportador do mundo em 2023, ultrapassando os EUA. Presente nas pequenas e grandes propriedades, grão teve recuo na área cultivada neste ano e expectativa é de redução na produção
No ano passado o Brasil se tornou o maior exportador de milho do mundo, ultrapassando os Estados Unidos. No entanto, devido à queda na produção interna, espera-se uma redução de 54 M/t exportadas para 36 M/t neste ano. Caso se confirme, o Brasil deve retornar à posição de 2° maior exportador de milho do mundo.
De acordo com o diretor técnico da Associação Brasileira dos Produtores de Milho e Sorgo (Abramilho), Daniel Rosa, o milho é uma das culturas mais importantes para a segurança alimentar, pois serve tanto para a alimentação humana quanto animal. Além disso, trata-se de um grão democrático que tanto pode ser cultivado em lavouras com alta tecnologia quanto por pequenos produtores. “Sua rusticidade e capacidade de adaptação a diferentes climas e altitudes proporcionou o surgimento de grandes civilizações no continente americano, como os Maias, Astecas e Incas. Não à toa, hoje se espalha por todo o planeta, sendo cultivado em todos os continentes”.

A área destinada ao cultivo de milho no Brasil recuou 6% se comparada a safra passada – uma redução de 22,2 milhões de hectares para 20 milhões de ha. Essa redução se deve, principalmente, pela queda no preço pago pela saca de milho e o aumento dos custos de produção. Para esta safra, a expectativa é de que ocorra uma redução de 12% na produção brasileira de milho, saindo de 131 milhões de toneladas na safra passada para 115,6 milhões de t para essa safra. Além da redução de área, também houve uma queda de 7% na produtividade média das lavouras. Conforme o diretor técnico da Abramilho, Daniel Rosa, isso ocorreu devido a questões climáticas, em especial, pela falta de chuva no período vegetativo das lavouras. A produtividade foi reduzida de 5.923 quilos por hectare para 5.516 quilos por hectare.
A cultura é produzida em todos os municípios brasileiros, sendo os maiores estados produtores, em milhões de toneladas: Mato Grosso (48,4), Paraná (15,5), Goiás (11) e Mato Grosso do Sul (8,4). Mato Grosso apresenta uma vocação para agropecuária com terras planas e boa distribuição de chuva ao longo do ano. E de acordo com Rosa, isso permitiu o plantio do milho, após a colheita da soja. Em 2024 o Estado dedicou 7 milhões de hectares para o plantio do milho, com uma produção de 48 milhões de toneladas e uma produtividade de 6.862 quilos de grãos por hectare ou 114 sacas de 60 quilos por hectare.

Milho presente nas pequenas e grandes propriedades
Conforme o diretor técnico da Abramilho, Daniel Rosa, o grão está presente tanto nas grandes como nas pequenas propriedades brasileiras. “Hoje se encontra tanto em lavouras com alta tecnologia, quanto em lavouras de subsistência. Estando presente, inclusive, em quintais e pequenas propriedades”, diz, explicando que este cenário se deve à versatilidade do milho, que serve tanto para a alimentação humana como um insumo importante para a alimentação animal.
“Há uma grande dificuldade de se contabilizar o milho produzido dentro de pequenas propriedades da agricultura familiar, uma vez que sua grande maioria se destina ao consumo próprio. Dados do último Censo Agropecuário do Ibge de 2017 apontam que a produção total de milho naquele ano foi de 88 milhões de toneladas, sendo 10 milhões vindas da agricultura familiar. Devido à baixa produtividade e a dificuldade de se mensurar essa produção, o Ibge aponta que são 1,6 milhão de produtores de milho no país, sendo 1,3 milhão de produtores da agricultura familiar”.
Rosa acrescenta ainda que o milho é uma cultura latino-americana milenar. “Se originou no México e faz parte da cultura brasileira. Sítios arqueológicos em Rondônia datados de 7 mil anos atrás trazem evidências do plantio do milho em território brasileiro”.
País segue autossuficiente na produção, mas entraves forçam SC importar do Paraguai
O Brasil é autossuficiente na produção de milho. O diretor técnico da Associação aponta que em 2024 a produção brasileira está estimada em 115 M/t, enquanto que o consumo interno esperado é de 84,2 M/t. “Vale destacar o constante crescimento do consumo interno no Brasil, ano após ano, há um incremento próximo a 5 M/t. Atualmente o setor consumidor de milho que mais cresce é o de etanol de milho. Em 2024, ao menos 15 milhões de toneladas de milho serão utilizados para a produção do combustível”, acrescenta.
Entretanto, apesar da autossuficiência, o país ainda importa uma pequena quantidade para atender principalmente o estado de Santa Catarina e sua vasta produção de aves e suínos. Aproximadamente 2,5 milhões de toneladas por ano, a depender do tamanho da produção nacional.
Rosa explica que isso acontece devido a diversos fatores que acabam tornando a importação mais vantajosa do que a compra do milho dentro do próprio país. “Devido à uma logística ruim, voltada para o transporte rodoviário, e a falta de uma infraestrutura de armazenagem adequada, acaba sendo mais vantajoso para o estado de Santa Catarina importar milho do Paraguai e da Argentina do que trazer do Centro-Oeste brasileiro. E uma solução para esse entrave, que vem sendo defendida pela Abramilho, é a construção da Ferroeste, uma ferrovia que ligará o Paraná, segundo maior produtor de milho do Brasil, com Santa Catarina. Essa ação deve reduzir a dependência de milho estrangeiro e dará maior liquidez para o produtor de milho do Paraná”, detalha.
Perspectivas para as próximas safras de milho
Daniel Rosa afirma que há uma tendência de aumento de área de milho para os próximos anos. “A possibilidade de plantio do milho em sequência da soja com novas variedades cada vez mais adequadas para esta janela de plantio, somada ao crescente mercado interno e as exportações para a China, mostram que o Brasil ainda tem muito espaço para crescer sua produção”, opina. Esse crescimento pode se dar, sobretudo, em áreas de pastagens degradadas. “Entretanto, observando o recorde de produção do ano passado em 130 milhões de toneladas, para 2030 o Brasil pode ultrapassar a marca de 150 milhões de t, podendo chegar a 200 milhões de t, isso mantendo o crescimento atual”.
Tecnologias em variedades
O Brasil conta com variedades de milho de ponta com alta tecnologia, no entanto ainda há muito espaço para crescer. “Enquanto a produtividade brasileira está em 5 mil quilos por hectare, nos Estados Unidos a produtividade média é de 12 mil quilos. Para isso, o Brasil além de investir em correção de solo e de um bom planejamento de plantio, também precisará contar com variedades com maior tolerância à seca e ao ataque de pragas como a cigarrinha-do-milho, o complexo de lagartas e percevejos”.
Há uma infinidade de variedades de milho de diversas cores e tamanhos. No entanto, mais comum é o milho amarelo e o milho branco. No México por exemplo, o milho branco é destinado ao consumo humano, enquanto o amarelo para alimentação animal. O Brasil produz quase que exclusivamente milho amarelo dentado.
Dentre as variedades de milho amarelo destacam-se cinco: dentado, doce, duro, mole e tipo pipoca. “O milho dentado é o mais produzido no mundo, quanto mais dentado o grão, maior a quantidade de endosperma farináceo. É utilizado para ração de gado e para elaborar féculas, xaropes, azeite e álcool”, explica.
Ampliação do cultivo pelos agricultores familiares
Para o diretor técnico da Abramilho, a ampliação do cultivo de milho pelos pequenos agricultores passa, necessariamente, pela adoção de tecnologia, melhoria no manejo da lavoura e assistência técnica. “Neste sentindo, o Projeto Prospera, no qual a Abramilho participa, se propõe a levar essas soluções para pequenos produtores da região do Semiárido. Espalhado por cinco estados, o projeto já mostra seus resultados, tendo atendido mais de mil produtores. Em Caetés (Pernambuco), por exemplo, um produtor de milho silagem saltou de 30 para 80 toneladas por hectare após a sua inclusão no programa”, declara.
Além do modelo tradicional, o milho se encaixa também na agrofloresta, já que seu rápido desenvolvimento (quatro meses), serve como uma fonte de renda para o produtor, além de ter uma boa produção de biomassa, que servirá de adubo para alimentar o sistema agroflorestal.
Outra técnica voltada para a agroecologia para pequenas propriedades, conforme Daniel Rosa, é o consórcio de milho, feijão e abóbora (Milpa). Um sistema onde o feijão utiliza o pé de milho como haste e a abóbora se espalha pelo chão, reduzindo a concorrência para o milho. “O cultivo conjunto de milho, feijão e abóbora, também conhecido como milpa, é uma técnica milenar que foi adaptada a diferentes biomas pela agroecologia. As plantas são companheiras e devem ser plantadas em sequência, com espaço suficiente para se desenvolverem”.
O cultivo conjunto tem várias vantagens, entre elas Daniel Rosa aponta: o milho fornece uma estrutura para o feijão; o feijão fornece nitrogênio; a abóbora gera de 20 a 30% mais produtividade do que quando cultivada sozinha. “É possível produzir uma boa quantidade de feijão e abóbora sem ter de gastar mais com a preparação do solo, capina e gestão”, acrescenta.
Preço X mercado
O preço interno pago ao produtor é balizado pelo preço na Bolsa de Chicago que, por sua vez, leva em consideração a produção de milho em cinco países principalmente: Estados Unidos, Brasil, China, Argentina e Ucrânia. A condição das lavouras nestes países que baliza o preço em Chicago. “Os Estados Unidos estão com uma boa safra para este ano e tudo indica uma recuperação na produção. Mesmo o Brasil tendo uma redução no volume produzido, a disponibilidade de milho no mercado internacional será suficiente para manter os preços em baixa no país. Para o próximo ano, não se espera uma grande reação nos preços internos, apesar do aumento constante do consumo interno no Brasil. O custo de produção não sinaliza que haverá uma redução. Apesar do cenário desafiador, o Brasil deve produzir algo entorno de 127 milhões de toneladas, uma recuperação se comparada a safra passada”, destaca.
Entraves que o setor enfrenta
O diretor técnico da Abramilho comenta que, mesmo seguindo autossuficiente na produção e presente em quase todas propriedades brasileiras, o cultivo do milho enfrenta alguns entraves. “Os principais desafios são: relação custo de produção com preço pago ao produtor, falta de um seguro rural de renda, segurança jurídica, infraestrutura de armazenagem deficitária e logística”, pontua.
Rosa explica que, dados do Cepea/USP indicam as dificuldades para a próxima safra devido ao aumento nos custos de produção, somados à queda no preço pago ao produtor pela saca de milho. “No caso de Sorriso/MT o custo total da lavoura de milho por hectare está estimado em 165 sacas de milho, enquanto a produtividade média do Estado está em 113,8 sacas por hectare. Em Rio Verde/GO, o custo total do hectare está em 99 sacas e a produtividade média do Estado é de 98 sacas. Logo, os produtores terão que superar a produtividade média do Estado para apenas cobrir os custos com a lavoura”. Já em Sorriso, o produtor terá que aumentar a produtividade de 113 para 165 sacas de grãos de milho por hectare somente para cobrir os custos de produção, conforme mostra o gráfico abaixo:

Outro desafio apontado pelo diretor técnico da Associação é o seguro rural. “É preciso aumentar o volume no Plano Safra e impedir que sofra cortes. Para isso, há um projeto de lei tramitando, aprovado na Câmara e está no Senado, que torna o recurso do seguro incontigenciável, ou seja, não pode sofrer cortes. Outro ponto importante é que o seguro garanta a receita do produtor e não apenas cubra os gastos, isso irá torná-lo mais atrativo”.
No que se refere à segurança jurídica, ele destaca que as invasões de terras e as mudanças nas legislações causam preocupação ao produtor e inibem o investimento. “Isso se reflete, por exemplo, na contratação de financiamento para armazenagem. O Brasil é deficitário, produz mais grãos do que é capaz de armazenar. Uma excelente solução seria aumentar a armazenagem dentro das fazendas que hoje representa apenas 15% das instalações. Por fim, a logística brasileira ainda precisa evoluir bastante. Um exemplo é o caso da Ferrogrão, que irá ligar o Mato Grosso ao porto de Santarém, no Pará. Além de reduzir o custo e tornar o grão mais competitivo, também pode reduzir em até 80% as emissões de CO². E, principalmente, reduzir o elevado número de acidentes fatais que ocorrem hoje na BR-163, sobrecarregada de caminhões que fazem o escoamento da produção do maior Estado produtor de grãos do Brasil”, conclui.


