Setor tem forte impacto na economia agrícola, valorizando produtos artesanais e fortalecendo a permanência de famílias no meio rural, com mais de 32 mil agroindústrias familiares no Estado
As agroindústrias familiares ocupam um lugar estratégico no desenvolvimento rural e na economia nacional. O Censo Agropecuário 2017 mostrou que o Brasil tinha na época, 1.527.056 agroindústrias distribuídas pelos seus 5.073.324 estabelecimentos agropecuários. Em todo o país, essas unidades de processamento não apenas agregam valor à produção primária, mas também desempenham um papel fundamental na manutenção da segurança alimentar e na criação de empregos no campo. Um exemplo notável deste setor encontra-se em Minas Gerais, onde mais de 32 mil agroindústrias familiares produzem uma vasta gama de produtos, gerando renda e dinamizando a economia local.
A agroindústria familiar brasileira é um dos motores mais importantes do desenvolvimento rural. De acordo com o Censo Agropecuário do IBGE, cerca de 4,4 milhões de estabelecimentos rurais no Brasil são classificados como de agricultura familiar, e grande parte deles dedica-se à agroindústria, processando alimentos que vão desde laticínios até conservas e bebidas artesanais. Esse segmento é responsável por uma parcela significativa da oferta de alimentos no mercado interno e também é uma importante fonte de produtos exportados, como cachaça e queijos artesanais.
A produção agroindustrial familiar promove não só a diversificação da economia rural, como também garante que os pequenos produtores possam agregar valor aos seus produtos. Ao transformar o leite em queijo ou a cana-de-açúcar em cachaça e rapadura, por exemplo, as famílias rurais conseguem elevar sua margem de lucro e, ao mesmo tempo, contribuir para a preservação das tradições culturais e gastronômicas do Brasil.

Além disso, de acordo com a assessora técnica da Emater/MG, Laura Peres de Castro Penna, as agroindústrias familiares desempenham um papel crucial na fixação das famílias no campo. “Ao criar oportunidades de trabalho e aumentar a rentabilidade das pequenas propriedades, esse modelo de negócio combate o êxodo rural, um dos maiores desafios enfrentados pelas regiões agrícolas brasileiras. O fortalecimento destas unidades produtivas também fomenta a criação de redes locais de comércio e consumo, promovendo o desenvolvimento sustentável e o dinamismo das comunidades rurais”, pontua.
Minas Gerais: modelo de diversidade e inovação
Minas Gerais destaca-se como um dos maiores polos de agroindústrias familiares no Brasil. O Estado abriga mais de 32.615 estabelecimentos familiares que atuam na agroindústria, conforme dados da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais (Emater/MG), distribuídos em 737 municípios mineiros. A produção anual dessas agroindústrias ultrapassa 148 mil toneladas de alimentos, que incluem desde queijos artesanais até produtos derivados da mandioca, frutas e cana-de-açúcar.
A diversidade de produtos processados pelas agroindústrias mineiras é uma das principais características do setor no Estado. Derivados do leite, como o famoso Queijo Minas Artesanal e o Requeijão Moreno, ocupam lugar de destaque na economia rural, mas outros produtos tradicionais, como rapadura, farinha de mandioca e doces de frutas, também têm um papel relevante. Essa diversidade é reflexo das características geográficas e culturais de Minas Gerais, onde diferentes regiões desenvolvem produtos agroindustriais que são um reflexo das tradições locais e do aproveitamento dos recursos naturais.
De acordo com a assessora técnica da Emater/MG, Laura Peres de Castro Penna, coordenadora do levantamento sobre as agroindústrias familiares do Estado, trabalho que faz parte do Safra Agroindústria (sistema eletrônico criado pela empresa, que apura anualmente os dados da produção de alimentos), esta é uma ferramenta estratégica para o desenvolvimento econômico, social e ambiental de MG.

O estudo que contempla dados de 2023 revela que mais de 98% das agroindústrias familiares em Minas Gerais são de propriedade individual, ou seja, são geridas e operadas por uma única família. “Esse perfil, que se repete em outras partes do Brasil, mostra como as agroindústrias são essencialmente negócios familiares de pequena escala, voltados à sustentabilidade e ao fortalecimento das economias locais”, enfatiza. Acrescentando que “os produtos são, muitas vezes, comercializados diretamente aos consumidores, seja em feiras locais, mercados ou por meio de plataformas de e-commerce, como a “ÉdoCampo”, que foi lançada pela Emater/MG para promover a venda online de produtos da agricultura familiar.
Exemplos de sucesso
Um exemplo que ilustra o impacto positivo das agroindústrias familiares vem da produtora Ligiane Copati de Almeida, em Queluzito. Ligiane, que deixou a profissão de enfermeira para investir na produção de iogurtes artesanais, utiliza o leite produzido na sua propriedade rural para fabricar iogurtes com sabores variados. Hoje, ela processa cerca de 400 litros de leite por semana, produzindo iogurtes em 19 sabores diferentes, muitos dos quais são feitos com frutas cultivadas na própria propriedade. Esse modelo de produção verticalizada, onde a matéria-prima e o produto final são geridos pela mesma família, permite a maximização dos lucros e a criação de um produto de alta qualidade, que já conquistou mercados em cidades maiores, como Belo Horizonte e Ouro Preto.
Outro exemplo vem de Coromandel, onde o produtor Marcos Vinícius Lazzarin Pereira transformou a produção familiar de leite em uma agroindústria de processamento de mandioca. Ao processar semanalmente cerca de 700 quilos de mandioca, Marcos conseguiu diversificar sua produção e ampliar o mercado de atuação. O apoio da Emater e da Vigilância Sanitária foi fundamental para que a família se profissionalizasse e garantisse a certificação sanitária necessária para expandir os negócios.
“Esses exemplos ilustram como a agroindústria familiar pode ser uma saída promissora para pequenos produtores que buscam agregar valor à produção agrícola e transformar seus negócios em empreendimentos viáveis, com potencial de expansão”, destaca a assessora técnica.
Realizando um sonho com a produção de queijo
Entre as muitas histórias de sucesso nas agroindústrias familiares, que estão além de Minas Gerais, destaca-se a de Denise Igansi, produtora de queijos e doces de leite em Pelotas (RS). Sua trajetória é marcada por determinação e superação de obstáculos para realizar o sonho de ter sua própria agroindústria. “Nossa propriedade tem 3 hectares, e nossa principal fonte de renda é a agroindústria”, conta, explicando como a transformação do leite produzido na fazenda em queijos e doces de leite foi uma decisão estratégica. “Optei pela agroindústria porque a empresa em que trabalhávamos não estava pagando bem pelo leite. Sempre foi meu sonho ter uma agroindústria e trabalhar com isso”.
O processo, porém, não foi fácil. “Foi muito difícil, porque ninguém apoiava a minha ideia. Aí em 2018 eu legalizei”, relembra Denise.
Desde então, ela e o marido trabalham juntos na produção de queijos e doces de leite, transformando cerca de dois mil litros de leite por mês. “Desse volume, cerca de 30% viram doce de leite e o restante em queijo”.
A comercialização dos produtos segue um modelo direto, sem intermediários: “Comercializamos na propriedade e em locais como feiras e festas municipais. Não trabalhamos com revenda, a gente vende direto para o consumidor. Montamos um ponto de vendas na nossa casa e é daqui que vendemos”, diz Denise com orgulho.

Essa conexão direta com o consumidor final não só permite que a família mantenha a qualidade e o controle sobre os produtos, mas também fortalece os laços com a comunidade local e regional, onde seus queijos são apreciados e buscados em eventos e feiras.
Acesso à informação e modernização auxiliam agroindústrias
A assistência técnica oferecida pela Emater/MG tem sido um diferencial no desenvolvimento das agroindústrias familiares. Os técnicos da empresa prestam suporte aos produtores em áreas como boas práticas de fabricação, gestão financeira, adequação às exigências sanitárias e estratégias de comercialização. Além disso, iniciativas como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) têm sido essenciais para garantir o acesso ao crédito e fomentar a modernização dessas pequenas indústrias.
Outro aspecto importante é o apoio às associações de produtores e cooperativas, que ajudam a fortalecer a atuação conjunta de pequenas agroindústrias. Essas associações permitem que os produtores ganhem escala e acessem mercados maiores, além de facilitar a certificação de seus produtos, ampliando as possibilidades de comercialização.
Desafios e oportunidades para o setor
Apesar dos avanços, as agroindústrias familiares ainda enfrentam desafios significativos. Entre eles, destacam-se a dificuldade de acesso a mercados maiores, os entraves burocráticos para a obtenção de licenças sanitárias e a falta de infraestrutura em regiões mais afastadas.
Para superar essas barreiras, o investimento em infraestrutura logística e o apoio governamental em termos de políticas públicas específicas são essenciais.
“Por outro lado, o setor também apresenta inúmeras oportunidades. A crescente demanda por produtos artesanais e sustentáveis, tanto no Brasil quanto no exterior, abre novas possibilidades de expansão para as agroindústrias familiares”, finaliza a assessora técnica da Emater/MG.

