O excesso de calor provoca fortes impactos sobre as plantas, e somente aumentar o fornecimento de água alivia, mas não resolve o problema. Isso é o que explicam três cientistas da Embrapa habituados a analisar o comportamento de espécies vegetais em uma das áreas mais quentes do país, o Semiárido, em sua maior parte localizada no interior da região Nordeste.
Os pesquisadores Magna Moura, Saulo Aidar e Agnaldo Rodrigues, da Embrapa Semiárido (PE), esclarecem que os impactos dependem de vários fatores, entre eles a fase fenológica em que a planta se encontra. Em fruteiras, por exemplo, pode causar o abortamento dos botões florais – que dariam origem aos frutos –, ou queimar aqueles que já se encontram em fase de amadurecimento – processo conhecido como escaldadura. Também pode reduzir as trocas gasosas e afetar a produtividade das culturas.
Experimentos mostraram que telas de sombreamento protegendo as culturas têm ajudado a mitigar os efeitos do calor. Estudo realizado com o cultivo de macieiras comprovou que o uso dessa estrutura para sombreamento no pomar resultou em maior desempenho fotossintético comparado ao ambiente a pleno sol.
“Esse resultado mostra que, em determinadas épocas do ano, a radiação solar na região é naturalmente excessiva para a fotossíntese de algumas culturas agrícolas, e pode impactar o desempenho fisiológico não somente pela quantidade de energia luminosa, mas também devido ao aquecimento excessivo do ambiente nos horários próximos do meio-dia”, ressalta Moura.

Estudo com o meloeiro amarelo híbrido, cultivado com irrigação e sob sol pleno, mostrou que as trocas gasosas nas folhas diminuíram progressivamente ao longo da manhã. Nesta condição, a fotossíntese alcançou os menores valores após as 13 horas, quando a temperatura da folha apresentava os maiores valores registrados (em torno de 36,7 ºC).
O experimento também englobou o cultivo de melão, da mesma variedade, mesma idade e na mesma área, porém usando cobertura agrotêxtil branca. O resultado foi maior abertura dos estômatos ao longo do dia, o que permitiu maior transpiração e, consequentemente, menor aquecimento das folhas.
Chaves conta que o uso da cobertura têxtil promoveu um microclima mais favorável para o desempenho fisiológico das plantas, mitigando o fator potencial de estresse térmico na cultura. “Mesmo sob menor radiação solar fotossinteticamente ativa, a fotossíntese foi favorecida e contribuiu para uma produtividade 35,15% maior do que na condição de cultivo a pleno sol”, destaca.
Como as temperaturas extremas afetam a agricultura
As condições climáticas são uma das principais razões para o sucesso da produção agrícola nacional, o que torna o Brasil um grande exportador de produtos agropecuários, além de produzir alimentos para sua população. Com a chegada da primavera, normalmente tem início o período de aquecimento do ar em grande parte do país, quando as temperaturas tendem a se elevar até o final do verão.
Em parte do Nordeste, as temperaturas já são elevadas durante todo ano, pois essa área localiza-se em uma região mais próxima à linha do Equador, que recebe elevados níveis de radiação solar o ano inteiro. Por isso, o calor intenso já faz parte do dia a dia das plantas cultivadas em um dos mais importantes polos de fruticultura do país, o Submédio do Vale do São Francisco.
Localizada em pleno Semiárido, no entorno das cidades de Petrolina, em Pernambuco, e Juazeiro, na Bahia, a região apresenta temperatura média anual de 27oC, e a média da temperatura máxima gira em torno de 34oC nos meses de outubro e novembro.
Em 2023, no entanto, os termômetros registraram valores acima de 39oC, ou seja, cerca de 5oC acima da média. “Sob essas condições, as principais frutíferas produzidas nessa região, onde são cultivadas sob irrigação, também sofrem impactos negativos”, relata a pesquisadora Magna Moura, da Embrapa.
Ela observa que esses padrões se repetem, pelo menos, desde a década de 1970, quando a Embrapa Semiárido começou a realizar medições de temperatura na Estação Agrometeorológica de Bebedouro, em Petrolina (PE).
Nesse período, foram observados diversos episódios de anomalia na temperatura média do ar, com picos que chegaram a até cerca de 5oC acima da média histórica. O mesmo acontece, também, para temperaturas abaixo da média, quando os menores valores são associados a eventos de chuva.
A pesquisadora explica que, em um dia ensolarado e sem nuvens, o aumento da radiação solar é acompanhado do aumento da temperatura do solo e do ar e, consequentemente, da diminuição da umidade relativa do ar. Isso aumenta a velocidade de perda de água pelas folhas, que nem sempre pode ser acompanhada pela velocidade de reposição, levando à desidratação.
Somente a água não resolve
Se uma das principais recomendações para as pessoas enfrentarem o calor com segurança é se hidratar, o aumento na oferta de água seria também uma solução para o problema das plantas? A resposta é: sim e não.
O pesquisador Saulo Aidar aponta que, “sob condições ótimas de umidade do solo, os efeitos fisiológicos negativos provocados pelo calor podem ser reduzidos, por isso se torna importante ajustar a irrigação, considerando, ainda, que nesses períodos a taxa de evaporação de água do solo também é maior”. No entanto, só a água não é capaz de eliminar os impactos das altas temperaturas, pois o desempenho das plantas é afetado, também, pela interação com outros fatores, como a radiação solar e a umidade do ar.
Segundo Aidar, em períodos muito quentes, mesmo havendo água no solo, a planta pode continuar apresentando aspecto de falta de água – situação conhecida como seca fisiológica. Entre os sintomas mais comuns estão o enrolamento e a mudança na inclinação das folhas, dependendo do horário do dia, para algumas culturas que apresentam essa característica, visando diminuir a absorção da luz solar.
O pesquisador lembra que a seca fisiológica também pode ocorrer por outras causas, como excesso de adubo no solo, excesso de salinização do ambiente, ou mesmo o excesso de água, provocando o encharcamento do solo. Pragas e doenças nas raízes também podem limitar o desenvolvimento das plantas, o que pode parecer dificuldade de absorção de água pela planta. “Por isso, é importante identificar corretamente quais as causas para que se possa buscar um manejo adequado”, reforça.
Fernanda Birolo
Embrapa Semiárido